O magistrado tirou a palavra da advogada Nilma Silva, presidente da Associação de Segmento de Pesca do estado
José Cruz/Agência Brasil |
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O ministro André Mendonça encerrou de maneira abrupta no último dia 2 uma audiência de conciliação no STF (Supremo Tribunal Federal) entre representantes da sociedade civil, do MDB e do PSD com o governador de Mato Grosso, Mauro Mendes (União Brasil).
O magistrado tirou a palavra da advogada Nilma Silva, presidente da Associação de Segmento de Pesca do estado, após ela acusar Mendes de ter interesse direto em uma lei que sancionou e agora tenta validar perante o Supremo.
"Doutora, a senhora está cassada a palavra. A senhora não tem decoro. A senhora realmente consegue ultrapassar os limites. Eu peço, governador, não vamos entrar mais em questões, não será mais concedida a palavra a ninguém", disse o ministro, conforme áudio obtido pela Folha.
Pouco antes, o ministro repreende um dos presentes sobre gravar a audiência. "O senhor não está gravando, não, né? Isso aqui não é espaço político", disse.
A legislação contestada na corte veda a pesca artesanal em Mato Grosso. Antes de fazer a acusação, Silva pediu a Mendonça que suspendesse a norma para que se começasse um "programa de sociogestão com as comunidades ribeirinhas para identificarmos se há necessidade de proibição da pesca ou não".
E emendou: "Sabemos que os vilões não são esses, são os garimpos, as dragas, as usinas, o mercúrio e outras propriedades, além de interesses, como vinculam jornais no Mato Grosso, para construção de usina da família do governador Mauro Mendes".
Na audiência, Mendonça afirmou que "o direito de voz nós conquistamos e precisamos ter responsabilidade diante do STF".
"Quero lamentar algumas cenas que presenciei aqui hoje. Eu caminhei uma milha, duas milhas, três milhas com todos os senhores tentando buscar uma equação. Fui criticado na imprensa por estar postergando definição e buscando consenso. Então, se não há responsabilidade nessa busca do consenso como hoje presenciei aqui, eu quero lamentar", disse o magistrado.
Por meio de nota, o gabinete de Mendonça afirmou que o ministro realizou a audiência "na tentativa de obter uma solução consensual", mas que "não teve êxito, pois não houve entendimento entre as partes".
Informou ainda que pediu um parecer à PGR (Procuradoria-Geral da República) sobre o tema e que, depois, tomará uma decisão no processo.
A controvérsia diz respeito à lei proposta e sancionada pelo governador no meio do ano passado que proibia a pesca artesanal no estado. A justificativa de Mendes era de que a legislação iria dobrar o turismo de pesca esportiva, com potencial para atrair e gerar empregos. Além disso, o Executivo estadual mencionava o risco a espécies de peixes com a continuidade da pesca artesanal, que ficaria vedada por 5 anos a partir de 2024.
Na época, o Ministério da Pesca se opôs e afirmou que priorizar a pesca amadora e esportiva em detrimento da artesanal era uma infração à lei nacional sobre o tema.
A pasta do governo federal afirmou, ainda, que a principal razão pela morte dos pescados não é o trabalho dos pescadores, mas a construção de barragens e usinas hidrelétricas.
A legislação foi alvo de ação do PSD e do MDB no STF. Mendonça foi sorteado relator e decidiu realizar audiências de conciliação a fim de encontrar um consenso entre as partes.
No começo de fevereiro, o governo estadual apresentou nova lei para proibir a pesca de mais de 100 espécies, mas vedar a de outras 12. A Assembleia Legislativa local aprovou a norma, que autorizava a atividades de povos originários que tenham a pesca como meio de subsistência e também liberava profissionais artesanais de atuarem nos rios da região, desde que atendidos alguns critérios.
O gabinete do ministro divulgou um termo da audiência assinado pelo juiz vinculado a Mendonça, Fernando Ximenes. No documento, ele não relata o entrevero com a advogada e apenas menciona os presentes na reunião, como os representantes dos partidos, do governo, da Assembleia Legislativa, do governo federal e dos partidos.
"Frustrada a conciliação, diante do impasse irredutível entre as partes, ao final, sua excelência o ministro André Mendonça declarou encerrada a fase conciliatória preliminar dos presentes autos e encaminhou o processo para decisão", diz o texto.
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